MEP

O MEP aí está! Foi aprovado. Dêem-se alvíceras! Convoque-se o que de melhor a nação tem. Obama yes we can change emulado por Rui Marques podemos fazer melhor! Muito melhor. E o primeiro passo é, como não poderia deixar de ser, formar um partido. Modéstia áparte não se trata de um qualquer partido, mas sim de um partido do centro que considera a disticao esquerda/direita de somenos. Estão no centro do quê, então?- perguntamos nós na nossa ingenuidade, e até com laivos de ignorância. Um centro sem plano. Um centro sem equidistância. Um centro sem direita nem esquerda, ou para lá das mesmas, é um centro descentrado. É um centro português, com certeza, é com certeza um centro português.

E enfim, esta retórica contém ressonâncias de um outro centro. Porém este não negava a esquerda nem a direita – apenas se colocava numa Terceira Via. Ainda assim, esta Terceira Via, assumida como território do compromisso e da superação do conflito político (não mais política como campo de batalha!) não partilhava, na sua essência, a retórica de tonalidades cristãs com que o MEP se anuncia. A esperança! Quem tem esperança sempre alcança. Rhonda Birnes – a do Segredo – acrescentaria que sem muito pensamento positivo, sem visualizar, não se consegue. Mas para além disso, são inegáveis as parecenças entre esta “esperança” e a fé. A fé no seu sentido mais literal, mais cristão; a fé como comunhão em cristo, no seu sentido mais paulino – fé como abandono ao salvador. Que neste caso é nem mais nem menos do que o inefável RM. Alguns disseram sim a esta chamada e secundam agora o líder na sua missão de instilar fé-esperança nas pessimistas consciências dos portugueses. Conhecendo alguns nomes, a coisa não augura nada de bom. E se a isso acrescentarmos o programa, que tresli com a atenção de um exegeta, então o quadro apresenta-se, no mínimo, nebuloso.

Uma coisa deve ser salientada: RM não deixa os créditos informáticos por mãos alheias. Por isso, é notório o investimento em parafernália mediática, por enquanto contido, porque estas coisas custam dinheiro, mas que dá sinais de vir a ser uma grande aposta tendo em atenção o cuidado colocado no site do novo partido. Contudo, o que tem de verdadeiramente mediático é o recurso sistemático a chavões e jargões em que o programa é pródigo. Neste sentido, não desmente este a linha de alguns dos membros da equipa, pródigos eles próprios na enunciação de vacuidades com a acentuação de luminosas considerações. Não admira que uma tal lâmpada atraia tais insectos.

Neste contexto, temos desde a famigerada “mesa para todos”, conceito axial de uma qualquer mundividência que possa ser identificada no arrazoado do programa do MEP, até ao “ser melhor – um objectivo para Portugal”. Dentro destes conceitos maiores podemos encontrar noções mais filosóficas como a de vivermos num “tempo plural e fragmentado” ou a de valores humanistas. Assim de repente, a única instituição que insiste em apregoar valores humanistas é a igreja. Some-se aos valores uma política de esperança e temos uma homilia do cardeal patriarca.

Há portanto neste novo partido a noção de transversalidade política que se subentende na mensagem católica. Note-se, porém, que isto é na mensagem e não na prática. Por conseguinte, alvitro que o MEP e o seu humanismo rapidamente mostrarão a sua face prática. Embora congregue este indivíduos com ligações diversas à igreja católica – uns estreitamente a ela ligados, de coração e carreira, outros sem notória propensão para a sacristia – a maioria fala este linguajar empastado. Por exemplo, a mesa para todos…esta é fácil: embora se arranje lugar para todos uns comem tudo e não deixam nada enquanto outros hão-de ficar a ver a banda a passar. Depois destas referências foleiras, devemos questionar o conceito: mesa para todos? E porque nao comida para todos? Muito communard, nao? Muito…canalha revolucionária. Mas eis que soam as trompetas celestes!

E eu vos destino o reino, como meu Pai mo destinou, para que comais e bebais à minha mesa no meu reino, e vos assenteis sobre tronos, julgando as doze tribos de Israel” (Lucas 22:29-30)

 

Então lhe disse Davi: Não temas, porque de certo usarei contigo de benevolência por amor de Jônatas, teu pai, e te restituirei todas as terras de Saul, teu pai; e tu sempre comerás à minha mesa. (2Sm 9:7)

 

Percebem de onde vem a “mesa para todos”? Claro que percebem!, nem eu me arrogava a dar-vos lições quando o cheiro do turíbulo entra de forma tão evidente pelas narinas mais apuradas. E não se trata de anticlericalismo – poupem-me ao menos a essa. Sucede que quem lê a Bíblia tropeça com a metáfora da mesa em cada epístula, a cada evangelho e até no momento de maior sufoco – o apocalipse – lá aparece uma mesa pronta a servir ou a ser negada. As conotações da “mesa para todos” nem são difíceis de rastrear.

 

Porém, pergunta-se: tem este projecto um projecto? Desde logo, a resposta só pode ser negativa. Qualquer coisa entre uma doutrina social católica recauchutada com as manigâncias do marqueting e as expressões exdrúxulas da publicidade. O reino do vazio, o que nos prometem, portanto. Ou não fossem parte da entourage uns tantos especialistas no verbo tão fácil quanto ignorante e tão enfático quanto vazio. Bazófia e água benta – era só o que nos faltava!

 

adenda : para se ver a diferença entre banha da cobra e política, deixo aqui isto. Não sei porquê, mas sempre gostei dele…

 

 

 

3 pensamentos sobre “MEP

  1. Eu li o tal programa dos ditos e curiosamente (ou talvez não) pauta mais pelas ausências que pelas presenças. Tudo o que têm sido questões com forte carga ideológica moderna (entenda-se: pós-iluminismo) que têm sido discutidas em Portugal são abordadas de uma forma indirecta ou simplesmente ignoradas. Suponho que para ao mesmo tempo não definir qualquer posição que pudesse alienar os mais ligados à Igreja e não dar uma impressão de fantoche católico a quem não quer partilhar a sua mesa com a instituição.

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